MPF recomenda retirada do nome do general Lyra Tavares de unidade militar em João Pessoa

Foto: 1° Gpt E/Divulgação
O Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao Exército Brasileiro a retirada do nome do general Aurélio de Lyra Tavares do 1º Grupamento de Engenharia, sediado em João Pessoa (PB). A unidade militar é citada por comissões da verdade como um local de repressão durante o regime militar brasileiro (1964–1985). A recomendação destaca que manter homenagens a figuras diretamente ligadas à ditadura contraria os princípios democráticos e o compromisso do Estado com a memória, a verdade e a reparação às vítimas.
De acordo com o portal do MPF, o órgão também orienta que o quartel estabeleça um espaço de memória e informação voltado à preservação da história e à promoção da educação em direitos humanos. A proposta integra ações da chamada Justiça de Transição, que prevê medidas para responsabilizar violações do passado autoritário, como reforma institucional e reparação simbólica.
Natural da Paraíba, Lyra Tavares foi uma das figuras centrais da ditadura militar. Comandou o IV Exército logo após o golpe de 1964, foi ministro do Exército entre 1967 e 1969 e integrou a junta militar que assumiu o governo após o afastamento de Costa e Silva. Nesse período, participou da promulgação de atos como o AI-5 e o AI-12, que intensificaram a repressão a opositores e declararam o país em “guerra revolucionária”.
O general também esteve envolvido na criação da nova Lei de Segurança Nacional da época (Decreto-Lei nº 898), que previa penas como banimento, prisão perpétua e até morte para opositores do regime. Ele é citado em documentos oficiais e obras como Liberdade Vigiada, que revela sua atuação como embaixador do Brasil na França (1970–1974), período em que colaborou com o monitoramento de exilados políticos brasileiros, mesmo sob o pretexto de proteção por parte do governo francês.
Apesar desse histórico, o nome do general foi atribuído ao 1º Grupamento de Engenharia em 1999. Relatórios da Comissão Estadual da Verdade da Paraíba e da Comissão Municipal da Verdade de João Pessoa apontam que o local funcionou como centro de vigilância e repressão durante o regime, inclusive com registros de prisões e torturas. Entre os casos citados está o da camponesa Elisabeth Teixeira, viúva de João Pedro Teixeira, líder das Ligas Camponesas assassinado em 1962.
Testemunhos de ex-presos políticos indicam que denúncias de tortura por parte de agentes da Polícia Federal foram relatadas a militares da unidade, sem que qualquer providência fosse tomada. Para as comissões, isso demonstra não apenas conivência, mas participação direta na estrutura repressiva do regime.
A recomendação do MPF alinha-se às diretrizes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que defende a retirada de homenagens a agentes da repressão e a renomeação de ruas, prédios e instituições. Em João Pessoa, a Avenida General Aurélio de Lyra Tavares também foi citada como exemplo a ser revisto.
O MPF lembra ainda que o Brasil tem obrigações internacionais no combate à impunidade por crimes cometidos durante a ditadura, conforme decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O país já foi condenado em casos emblemáticos como a Guerrilha do Araguaia (2010) e Vladimir Herzog (2018), com o entendimento de que crimes como tortura e desaparecimento forçado são imprescritíveis.
Para o procurador da República José Godoy, responsável pela recomendação, o reconhecimento oficial das violações de direitos humanos é essencial para impedir que elas se repitam. “É assim que se constrói uma verdadeira cultura de responsabilidade”, afirmou.
Por Paraíba Master