Após 49 anos, corpo do pianista Tenório Jr. é identificado na Argentina; BNDES realiza homenagem com Gil, Caetano e outros artistas

Foto: Divulgação
O corpo do pianista brasileiro Francisco Tenório Júnior, desaparecido durante a ditadura militar argentina em 1976, foi oficialmente identificado quase cinco décadas após sua morte. O anúncio foi feito em setembro deste ano, com base em exames de impressão digital realizados pela Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF).
Conhecido como “Tenorinho”, o músico carioca foi um dos grandes nomes da música instrumental brasileira, com forte atuação no samba-jazz e na bossa nova. Ele desapareceu em Buenos Aires no dia 18 de março de 1976, após sair do hotel onde estava hospedado para comprar cigarros e remédios. Na época, acompanhava Vinícius de Moraes e Toquinho em uma turnê pelo Uruguai e Argentina.
Segundo a EAAF, Tenório foi sequestrado, torturado e executado por agentes da Operação Condor — aliança repressiva entre regimes militares da América do Sul para eliminar opositores políticos. Seu corpo foi enterrado como indigente no cemitério de Benavídez, na capital argentina. Os restos mortais, no entanto, não puderam ser recuperados.
A identificação põe fim a um mistério que perdurou por quase 50 anos e marca um novo capítulo na luta por memória e justiça no Cone Sul. Tenório Jr. já havia sido reconhecido como desaparecido político pelo Estado brasileiro. Seu nome também consta no Parque da Memória, em Buenos Aires, que homenageia vítimas da ditadura argentina.
Homenagem no BNDES reúne grandes nomes da música brasileira
Para marcar o reconhecimento oficial e celebrar o legado artístico de Tenório Jr., o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) realizou nesta quarta-feira (1º) um ato cultural em sua sede, no Rio de Janeiro. O evento foi coordenado por Gilberto Gil e contou com apresentações de Caetano Veloso, Joyce Moreno e Marcos Valle — artistas que, assim como Tenorinho, ajudaram a moldar a música popular brasileira.
O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, destacou a importância do momento como parte do processo de reconstrução da memória histórica e dos direitos humanos no país. Familiares de Tenório Jr. estiveram presentes, assim como parentes de outras vítimas da repressão, como Eunice e Rubens Paiva — esposa e filho do deputado federal Rubens Paiva, também morto durante a ditadura brasileira.
Lideranças dos movimentos Mães da Praça de Maio (Argentina) e Marcha do Silêncio (Uruguai) também participaram do ato, reforçando o caráter regional da luta por justiça. “A única luta que se perde é a que se abandona”, declarou Helena Molinaro, representante das Mães da Praça de Maio, que desde 1977 exigem respostas sobre os filhos desaparecidos durante o regime militar argentino.
Legado interrompido pela violência
Francisco Tenório Jr., nascido no bairro de Laranjeiras, no Rio de Janeiro, era um pianista consagrado por sua habilidade em fundir bossa nova e jazz. Trabalhou ao lado de artistas como Gal Costa, Milton Nascimento, Toquinho e Vinícius de Moraes, deixando sua marca na música brasileira dos anos 1960 e 70.
O perito argentino Lucas Guanini, da equipe responsável pela identificação, destacou a importância do trabalho forense para dar respostas às famílias dos desaparecidos. “Nosso objetivo é oferecer às famílias um encerramento digno e verdadeiro sobre o paradeiro de seus entes queridos”, afirmou.
Apesar da confirmação da identidade, o corpo de Tenório não foi recuperado, permanecendo como um dos muitos desaparecidos enterrados sem nome nos anos de chumbo da América Latina. Ainda assim, a identificação representa uma vitória simbólica para familiares e defensores dos direitos humanos, reafirmando o compromisso com a verdade histórica.
Por Paraíba Master